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quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Estratégias de Referenciação em Textos Multimodais

Segue meu artigo apresentado no "XI Seminário de Literatura, História e Memória" e "II Congresso Internacional de Pesquisa em Letras no Contexto Latino-Americano" realizado na Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), nos dias 27, 28 e 29 de novembro de 2013. O tema escolhido para a edição 2013 foi "Confluências entre literatura, cultura e outros campos do saber".
 

 
 
Estratégias de Referenciação em Textos Multimodais
 
Elizete Inês Paludo (Unioeste)
 
RESUMO: Um ensino de qualidade é de fundamental importância para a sociedade que dele necessita para melhor sobreviver. Na atualidade, momento no qual a globalização lidera, não há como sobreviver sem ter o domínio de algumas competências básicas ligadas à compreensão da estrutura e dos usos sociais da língua. Todavia, o pouco êxito dos estudantes brasileiros em avaliações de aprendizagem, ou os eventuais índices de evasão e retenção, são reveladores de que a educação precisa ser tratada com maior seriedade e compromisso. Embora vários autores tenham abordado temáticas a esse respeito, ainda são necessários avanços nas práticas educacionais do cenário brasileiro. O estudo proposto busca contribuir no sentido de levar o aluno à apreensão dos sentidos veiculados pelos textos, com posicionamento crítico e maior domínio dos recursos que a língua dispõe. Parte-se da premissa de que o arcabouço teórico da Linguística Textual é válido não somente para a compreensão de textos escritos, mas também para que se possa entender a relação referencial em textos muldimodais.  Para dar sustentação a esta proposta, o respaldo teórico é buscado em autores como Bakhtin (2003), Koch (2006, 2008, 2009a, 2009b 2010, 2011), Marcuschi (2006, 2007, 2012) e outros estudiosos no assunto. A referenciação é assumida como atividade discursiva realizada negociadamente na construção de objetos-de-discurso. Torna-se viável, assim, investir na compreensão da articulação dos mecanismos da língua. A título de demonstração, o corpus  constitui-se de uma tira cômica construída com apoio em elementos verbais escritos e visuais.
Palavras-chave: Referenciação; Multimodalidade; Ensino.
 
ABSTRACT: A quality education is fundamental to society that it needs to better survive. At the present moment in which globalization leads, there is no way to survive without having the domain of some basic skills related to the understanding of the structure and the social uses of language. However, the limited success of Brazilian students in learning assessments, or any dropout rates and retention, are revealing that education still needs to be treated with utmost seriousness and commitment. Although several authors have addressed issues about it, you realize the need for advancements in the educational practices of the Brazilian scenario. The proposed study seeks to contribute in bringing the student to learn the sense conveyed by the texts, with critical positioning and greater mastery of the resources that language has. It starts with the premise that the theoretical framework of Textual Linguistics is valid not only for the understanding of written texts, but also so that we can understand the relationship referential texts muldimodais. To give support to this proposal, the theoretical support is sought on authors such as Bakhtin (2003), Koch (2006, 2008, 2009a, 2009b, 2010, 2011), Marcuschi (2006, 2007, 2012) and other scholars on the subject. Referral is assumed as discursive activity performed negociadamente in building objects-to-speech. Becomes feasible, thus investing in the joint understanding of the mechanisms of language. By way of demonstration, the corpus is made up of a comic strip built with support verbal elements in written and visual.
Keywords: Referencing; Multimodality; Education.
 
 
1 Introdução
 
 
No mundo globalizado da atualidade, as comunicações se dão por formas rápidas e intensas, pois os meios de comunicação propiciam maior interação entre os povos. Com a revolução tecnológica, os hábitos humanos são alterados e as necessidades comunicativas evoluem junto aos modos de persuasão. Em termos de estudos linguísticos, o que se verifica é a necessidade de um novo enfoque para o ensino do texto escrito, que não dá conta de abarcar a totalidade dos usos da língua e de seus fenômenos recorrentes nas práticas sociais ao serem demarcados pela estruturação de textos multimodalizados, constituídos de multisemioses.
Nesse âmbito de mudanças, o ensino de língua portuguesa nas escolas revela-se como uma das áreas que mais sofreu influência das tecnologias. O apelo visual influencia a estrutura textual em que apenas uma representação semiótica torna-se insuficiente para atender às necessidades sociais. Entre elas, a transmissão de mais informações em enunciados de menor tamanho e a exigência de maior esforço para a captação das intenções de produtores textuais distintos. O ser humano, assim, necessita da mobilização de vários conhecimentos que vão da linguagem verbal presente na superfície textual às linguagens constituídas de múltiplos códigos comunicativos (expressão facial, sinais, sons, cores etc.) para que possa compreender as mensagens veiculadas, sendo-lhe inviável a compreensão global sem que investigue também os elementos não verbais presentes na constituição da tessitura textual.
Consta nas Diretrizes Curriculares de Língua Portuguesa (DCE/PARANÁ, p. 68) como conteúdo estruturante “o discurso como prática social”. O referido documento evidencia a necessidade de fundamentar práticas de ensino que desenvolvam a compreensão do funcionamento dos textos para além do senso comum. Nesse viés, o ensino da língua requer investimento contínuo em estratégias vinculadas à formação de leitores proficientes, no sentido de rever paradigmas do ensino, em maioria voltados a aspectos da modalidade verbal.
Quando se trata do texto multimodal, vários fatores são acionados para que a leitura empreendida capture os sentidos possíveis. É nessa direção que o estudo proposto aponta, na tentativa de proporcionar o desenvolvimento de práticas pedagógicas mais eficazes, capazes de impulsionar o processo de leitura a partir da análise do modo como os componentes da língua são representados e relacionados na escrita. Sendo assim, importa investigar como os objetos-de-discurso, indiciados por pistas linguísticas e completados por inferências variadas, constroem os sentidos veiculados pelos textos e também como se comportam esses elementos referenciais em gêneros multimodalizados, como: charge, tira cômica, propaganda e outros. Contudo, a título de delimitação, o foco deste estudo consiste em analisar a tira cômica (texto curto, com desfecho inesperado, como em uma piada). Causa interesse a soma de elementos multimodalizados presentes nessa trama textual, articulados de forma a fazer com que o interlocutor considere as intenções do falante quando acionadas no jogo discursivo. 
 
Se sentidos são construídos e relações são estabelecidas nas tiras cômicas por meio dos conteúdos ou discursos veiculados, são merecedoras de atenção. Importam os significados por elas gerados a partir de linguagem verbalizada e arranjos visuais (cores, imagens, tipos, tamanhos de fontes, formatos, expressões faciais etc.) que propagam sentidos ao mesmo tempo em que expõem de algum modo a autoria de quem os representa. Ao demarcarem determinadas relações, configuram o processo de referenciação na elaboração de textos. Nesse caso, a construção de significados não se dá por mera representação das coisas, mas por cadeias associativas de elementos intra e extralinguísticos que compõem a significação. Por serem assim constituídas, exigem do leitor a mobilização de conhecimentos que possam permitir a compreensão. Um trabalho educativo responsivo, que preza pelo desenvolvimento de habilidades de senso crítico e argumentatividade, deve levar em conta tais fatores.
Essas premissas respaldam-se em ideias de Bakhtin (2003), Koch (2006, 2008, 2009a, 2009b 2010, 2011), Marcuschi (2006, 2007, 2012) e outros pesquisadores no assunto.
 
 
2 A produção do sentido
 
 
Estudos realizados acerca do insondável mistério das comunicações dão conta de que a aptidão comunicativa decorre das necessidades de interação na busca da sobrevivência. No entanto, as ações diárias significativas da vida do ser humano são dotadas de complexidade. Elas perpassam o tempo e ganham sentido pelo funcionamento da linguagem que possibilita atribuir sentido ao mundo, influenciar ou ser influenciado. As habilidades de lidar com os processos de leitura e escrita permitem a conexão entre os conhecimentos de outros tempos e espaços. Concebe-se, assim, que a língua veicula os sentidos construídos em cada cultura às pessoas. As palavras, ao serem constituídas por marcas ideológicas diversas, passam a representar imagens cada vez mais heterogêneas em forma e em conteúdo de modo a possibilitar as relações plurissignificativas no e a partir do texto, que se projeta como um produto para além da materialidade linguística. Na recusa de deixar-se conduzir pelas mensagens contemporâneas que permeiam os processos enunciativos de organização do poder, diferentes habilidades de linguagem passaram a ser necessárias, entre elas, a atribuição de sentido a mensagens oriundas de múltiplas fontes de linguagens.
 
Dessa forma, ao compreender que as ações rotineiras de fala ou escrita interferem de modo inconsciente nas formas de pensar e agir socialmente, Marcuschi (2012, p. 233) pede maior esforço do leitor para a “identificação de informações com base em atividades inferenciais”. Bakhtin (2003, p. 317) atenta para os valores sociais que costumam ter efeito sobre a língua nas construções linguísticas que, ao permearem ações sociais, impregnadas de fenômenos multimodais em representações distintas, não podem ser entendidos “em termos puramente linguísticos”. Para Koch e Elias (2010, p. 21), considerar as alterações contínuas nos modos de conceber o conhecimento “implica aceitar uma pluralidade de leituras e de sentidos em relação a um mesmo texto”. Pressupõe também refletir sobre as ações realizadas com o uso de uma linguagem eficiente e sua função como mediadora das práticas sociais.
Essa preocupação faz parte do interesse de estudos da Linguística Textual que, segundo Koch (2011, p. 23), por muito tempo esteve ligada à análise das relações interfrásicas. No caso da referenciação, a análise era pautada na organização de termos ou frases, sem aprofundar o estudo dos sentidos gerados a partir da relação construída. Hoje, segundo Koch (2006, p. 264), a análise do fenômeno referencial anafórico leva em conta a retomada (ou não) de referentes. “No primeiro caso, pode haver simplesmente a correferência entre a expressão anafórica e seu antecedente  textual, ou ocorrer a recategorização deste”. As anáforas com retomada de antecedentes textuais ocorrem por elipse, repetição e pronome. E a classificação proposta é: 1 anáforas correferenciais sem categorização: 1.1 por repetição total ou parcial; 1.2 por sinonímia ou parassinonímia; 2 anáforas correferenciais recategorizadoras: 2.1 hiperonímia; 2.2 retomada por termo genérico; 2.3 retomada por descrições nominais; 3 anáforas não-correferenciais: 3.1 indiretas; 3.1.1 associativas; 3.2 rotuladoras.
De acordo com Ilari (2001, p. 105), hoje o estudo da referenciação trata de “um funcionamento linguístico do qual sabemos menos do que gostaríamos”, o que torna o estudo  um grande desafio a todo estudioso que procura compreender os fenômenos linguísticos. É como diz Ramos (2012, p. 743), “este século tem inserido no escopo da Linguística Textual diferentes desafios a serem enfrentados teoricamente”. São noções que desafiam à ampliação de conceitos e revisão de análises instituídas como adequadas aos textos. Levam a considerar também que a significação dos termos da língua não se restringe aos textos em si, mas a componentes vinculados a eles, aos objetos que fazem remissão e a outros componentes linguísticos inferidos, não ficando limitados a observações apoiadas apenas no nível frasal.
 
Para Marcuschi (2007, p. 32), são indagações que movem investigações dos fenômenos linguísticos na busca de compreender, entre outros aspectos, “como se constitui e caracteriza nossa inserção cognitiva no mundo mediada pela linguagem”. No entanto, sobre como as informações são processadas (ou não) e até que ponto um leitor com pouco conhecimento sobre os usos e abusos da linguagem se mostra capaz de fazer interpretações coerentes com as ideias veiculadas no texto, ainda pouco se sabe a respeito. É a partir de questões como essa que Ilari (2001, p. 104) questiona se podem haver limites para as possibilidades de associação no momento em que se percebe “a atividade linguística como uma atividade cooperativa”. O que se pode dizer, com apoio em estudos realizados, é que tem a possibilidade de detectar com maior facilidade e precisão as armadilhas persuasivas advindas de elaborações cuidadosas de uso da língua, aquele que detém maior domínio dos conhecimentos sobre as estratégias verbais e simbólicas na elaboração dos discursos.
Para Koch (2008, p. 18), um dos problemas evidenciados no ensino – estudar partes isoladas e não o texto por completo – advém do cognitivismo clássico em que a mente era concebida como desvinculada do corpo. Um conceito que só foi superado quando estudiosos insistiram em comprovar que na mente dos indivíduos as ações são interligadas pela presença de interlocutores distintos numa inter-relação complexa. É nesse sentido que estão os estudos de Koch (2009a, p. 31) e Marcuschi (2006, p. 15) quando apontam para a verificação mais atenta dos modos como os termos da língua são relacionados para a transmissão dos sentidos. Assim, sugerem que se deve preferir a noção de referenciação à noção de referência porque o uso de expressões anafóricas no ato interpretativo consiste em estabelecer ligações para além dos segmentos linguísticos, com apoio em informações armazenadas na memória discursiva. Conforme esclarecem esses autores, o sujeito (re)constrói os objetos-de-discurso pelo modo sociocognitivo com que interage no entorno físico, social e cultural. Assim, o texto deixa de ser percebido como algo vinculado apenas na relação entre palavras e coisas e passa a ser visto a partir das relações complexas (intersubjetivas e sociais) das versões do mundo que são alteradas continuamente na pretensão de atender aos propósitos interlocutivos de cada sujeito.
Conforme postula Bakhtin (2003, p. 312), “a atitude humana é um texto em potencial”, o que possibilita o raciocínio e, consequentemente, a pesquisa. Em prol do que foi criado se constitui e, ao perambular pelas vozes do sujeito-leitor, confronta-se com sentidos diversos nem sempre previsíveis quando acionados no jogo discursivo. Nessa linha de raciocínio, cada ser humano se constitui por múltiplas vivências e experiências. Assim, em cada texto produzido se concentra não só a manifestação individual do autor mas também as interferências (do vínculo social, do psiquismo, da história, das constatações e seus devidos juízos de valor) que o constituem enquanto sujeito. O autor-sujeito conscientiza um mundo ao mesmo tempo em que se relaciona com os objetos da representação por ele criada. Entretanto, as situações de discurso das personagens e do discurso idealizado inicialmente podem entrecruzar-se. Esse confronto entre situações de discurso com suas devidas relações entre os enunciados ou dos enunciados com a realidade que permeia ou extrapola o ambiente textual é concebido por Bakhtin (2003, p. 312) como dialógico, pelo entendimento de que é nesse dialogismo que o sentido é estabelecido.
 
O fato de que os sujeitos interagem sociocognitivamente e linguisticamente, se constroem e são construídos pelas ações textuais é considerado neste estudo que busca ampliar a compreensão da articulação dos mecanismos da língua em aspectos de referenciação e multimodalidade para apreender o processamento do sentido nos textos.
Conforme orienta Marcuschi (2012, p. 94), “um texto é uma proposta de sentido e ele só se completa com a participação do seu leitor/ouvinte”. Mas autor e leitor, para procederem às ações textuais de acesso à construção do sentido, devem acionar aspectos linguísticos, sociais e cognitivos, o que leva Marcuschi (2012, p. 97) a considerar o texto como “uma atividade sistemática de atualização discursiva da língua na forma de um gênero”.
Pelas premissas de Koch e Elias (2010, p. 11), o texto é “uma atividade interativa altamente complexa na produção de sentidos” e pela organização dos elementos linguísticos são mobilizados saberes no evento comunicativo (concepção de base sociocognitiva e interacional). O texto é um evento interativo por conter co-autorias em vários níveis e ser composto de elementos multifuncionais sob vários aspectos para comunicar, o que implica em processá-lo levando em conta essa multifuncionalidade.
Desse modo, sob a lógica da Linguística Textual, numa perspectiva sociocognitivista, considerando as múltiplas formas comunicativas, adota-se neste estudo a noção de texto postulada por Koch (2008, p. 31):
 
 
 
O texto passa a ser visto como o próprio lugar da interação e os interlocutores como sujeitos ativos que – dialogicamente – nele se constroem e por ele são construídos. A produção de linguagem constitui atividade interativa altamente complexa de produção de sentidos, que se realiza, evidentemente, com base nos elementos linguísticos presentes na superfície textual e na sua forma de organização, mas que requer não apenas a mobilização de um vasto conjunto de saberes, mas, sobretudo, a sua reconstrução no momento da interação verbal (KOCH, 2008, p. 31).
 
 
 
A esse respeito, Tasso (2006, p. 116) destaca a necessidade de meios mais eficazes para a constatação das múltiplas realizações linguísticas verbais e não verbais que se manifestam na textualidade. E afirma haver na materialidade discursiva dos textos inúmeros mecanismos e estratégias que envolvem aspectos verbais, visuais e sonoros, cujos “valores simbólicos intervêm cultural e socialmente na constituição dos sujeitos”, o que possibilita refletir sobre os modos como estes se encontram nela representados talvez ao sofrer consequências desses discursos sem a percepção disso.
Martins (1984, p. 32), solicita do leitor maior esforço para compreender a linguagem e exercitar a memória no enfrentamento de forças ideológicas que sustentam discursos em processos de direcionamentos de sentidos. No que concerne ao ato de ler além da escrita, além do gesto mecânico de decifrar os sinais, é preciso que uma conjunção de fatores pessoais com o momento, o lugar e as circunstâncias comecem a fazer sentido. A leitura, portanto, deve ser experienciada como um processo de compreensão de expressões formais e simbólicas, não importando por meio de que linguagem. Afinal, no processo interacional, a comunicação não se dá só em palavras faladas e escritas mas também pela utilização de códigos semióticos.
Para Ferraz (2008, p. 02), “o constante surgimento de avanços tecnológicos confere às práticas sociais as mais diversas novas configurações linguísticas, que lançam mão de semioses”. Logo, para ler as mensagens contemporâneas, é preciso perceber os sentidos implicados nas modalidades verbais e não verbais. A leitura deve prever os sentidos gerados pela linguagem verbo-visual, considerada de forma entrosada porque, ao fazer parte de um mesmo texto, assume relações de sentido que só serão percebidos na análise atenta do todo.
Entende-se que esse seja um dos desafios desse século: conseguir lidar com manobras discursivas multimodais relacionadas capazes de interferir nas formas de produção de sentido com vistas à atuação social do educando. Importa, portanto, o modo como o professor auxilia o aluno na percepção das relações entre diferentes linguagens com distintos modos de representação na construção de um sentido global coerente. Habilidades que vão desde a capacidade de usar o conhecimento gramatical à percepção das relações entre palavras para depreender das estruturas textuais atitudes e intenções, pois só quando são conhecidos mecanismos de leitura variados, as atribuições de intenções pelo autor são mais perceptíveis.
 
Para o reconhecimento do implícito em construções textuais audaciosas e complexas, Koch e Traváglia (2009b, p. 103) sugerem um trabalho voltado perspectiva textual-interativa, pois o aluno precisa “ser capaz de interagir com variedades distintas de língua, inclusive a norma chamada culta que, pelas regras de nossa sociedade e cultura, considera-se a adequada em determinadas situações”. Vale lembrar que a percepção dos propósitos textuais depende do repertório em conhecimentos de leitura, pois essa competência é determinante na apreensão do sentido. Se bem informado, o leitor conta com maiores chances de perceber os posicionamentos do autor veiculados no texto. Evidencia-se, assim, a necessidade de uma leitura mais atenta diante das mensagens dotadas de alguma complexidade.
Koch (2011, p. 157) explica que representamos a realidade a partir do modo como a percebemos, pelos aspectos que atribuímos maior relevância, “de tal modo que os textos não apenas tornam o conhecimento visível, mas, na realidade, sociocognitivamente existente”. Devido a isso, sentimos necessidade de formas novas e eficientes para representar o mundo que nos rodeia. O mesmo fenômeno ocorre nos estudos do texto. Em outros termos, os estudos atuais da Linguística Textual não somente trouxeram algumas elucidações para os diálogos travados historicamente sobre o texto como também deram vida a novos questionamentos, também merecedores de atenção.
Geraldi (1984, p. 43) lembra que é no interior do funcionamento da língua que está a possibilidade do professor de desvelar ao aluno as manobras discursivas que podem induzi-lo a ações determinadas. Este deve mostrar ao aluno a existência de diferentes posicionamentos, equipando-o para que possa adotar a postura que julgar mais conveniente ao posicionar-se diante dos compromissos criados pelo interlocutor, lembrando ainda que não é qualquer sentido que pode ser atribuído ao texto.
 
 
Os sentidos produzidos na leitura resultam de duas dimensões possíveis: uma em que a cooperação do leitor se realiza por sua atenção a seus “deveres fisiológicos”, isto é, de sua tentativa renhida de recuperar com a máxima aproximação possível as estratégias usadas na produção e, com as pistas que as revelam, aproximar-se do sentido que lhe previu o autor; ou seguindo a dinâmica da semiose, ilimitada, produzir infinitos sentidos no contraponto das estratégias de produção e das estratégias de leitura (GERALDI, 2003, p. 110).
 
 
 
Conforme argumenta Pinheiro (2012, p. 07), sob um ponto de vista sociocognitivo e interacional, o texto revela-se um fenômeno multifacetado. Sendo assim, “a análise textual deve considerar também os múltiplos fatores, cognitivos e discursivos, que entram na sua constituição e na construção do seu sentido”.
Para melhores resultados no ensino, a análise empreendida em textos de cunho multimodal precisa considerar o todo textual verbalizado e visualmente representado. Deve-se levar em conta na interpretação não só a constituição verbal mas também os elementos não verbais para, a partir daí, investigar os sentidos que podem ser autorizados a partir do texto. Mudar o perfil do trabalho com os textos é necessário numa sociedade em permanente (re)elaboração que faz uso dos elementos da língua de várias formas possíveis. Assim são os objetos-de-discurso, indiciados por pistas linguísticas e completados por inferências variadas, o que leva a perceber elementos verbais e não verbais como parte de um todo que é o texto.
O foco, como já dito, é na tira cômica. Segundo Ramos (2009, p. 02), “este tende a ser um texto tendencialmente curto, com personagens fixos ou não, que apresenta um desfecho inesperado no final, tal qual uma piada”. A soma de elementos multimodalizados confere a essa configuração textual um processamento que se articula de modo relacionado e obriga a considerar ainda as intenções do falante postas no jogo discursivo. Algo que pode ser feito pela remissão a elementos compostos por palavras e imagens que, de forma associada, possuem maior força comunicativa para persuadir o interlocutor.
Para Ramos (2012, p. 751), a referenciação pode ser investigada em tiras cômicas a partir da análise das “informações verbovisuais presentes entre um quadrinho e outro, estabelecendo entre eles relações de cunho coesivo”, tendo por base o modo como se relacionam os objetos-de-discurso no processamento textual. O sentido é construído no gênero multimodal pela sucessão coesa e coerente de enunciados verbalizados e visuais.
 
 
 
3 O corpus
 
 
A tira selecionada tem autoria de ZOPE (2007) e foi retirada do Blog Resistência, disponibilizado no endereço eletrônico <http://resistenciabr.wordpress.com/2007/03/02/tira-comica-10/>. Com base nas teorias explicitadas nas páginas anteriores, segue a análise.





As expressões referenciais usadas verbalmente na tira cômica para retomar e recategorizar o sintagma nominal “a maioridade penal” ocorrem a partir da retomada pronominal “isso” em todos os balões de fala. Em cada momento que o referente é retomado, os sentidos são transmitidos ao leitor de modo alterado. Em “nada disso”, o sentido é genérico e engloba as informações “a maioridade penal” e “tolerância zero”. Na sequência, enquanto o adulto tem como apoio a informação “a maioridade penal”, a criança ampara-se em “tolerância zero”. A partir daí, em cada balão a retomada pronominal é recategorizada de modo a não comprometer o entendimento do leitor e ainda conseguir o efeito humorístico.
A representação visual corrobora para a transmissão das informações textuais. No primeiro quadrinho, pode-se dizer que o adulto é um político ou empresário por causa do modo como o personagem é apresentado na tira: de terno e gravata, com postura de alguém que está em boa situação financeira e ainda assumindo o papel de um bom sujeito ao fazer agrados em alguém que não tem tais condições de vida. Num primeiro momento, o olhar do adulto representa solidariedade a uma causa social (ajuda a quem vive à margem do sistema social instituído como direito a todo cidadão). Por outro lado, a criança que num primeiro momento transmite um olhar carente (e até recebe afago), depois é recategorizada como a vilã que causa medo a pessoas de bem. Trata-se, então, de uma negociação indireta possibilitada pela mobilização de esquemas mentais implícitos. Como a relação foi marcada por uma associação mais complexa de ideias, representa um caso de anáfora não-correferencial indireta ou associativa baseada em frame.
 
No caso das retomadas feitas a partir da linguagem verbal, chamam a atenção os objetos-de-discurso “criança” e “tio” pela recategorização sofrida. No entanto, esses termos são retomados com a conservação do núcleo de significação do referente, o que implica em correferência. Seriam casos de anáfora correferencial com recategorização do referente, mesmo que as retomadas tenham ocorrido por pronome e de modo elíptico.
Assim, as formas visuais e verbais se complementam nas formas de retomar e recategorizar (ou não) o referente. No que diz respeito a uma classificação das anáforas apenas pela constituição dos elementos simbólicos, a análise parece ficar restrita à categorização e recategorização do referente, à correferencialidade e não-correferencialidade. Mesmo assim, existe a possibilidade de análise da referenciação no texto sob a luz dos princípios teóricos da Linguística Textual. Estão entre os procedimentos usados para a compreensão da relação entre os elementos fóricos no texto: a) identificação da presença dos elementos referenciais nos textos; b) classificação das anáforas identificadas; c) análise dos empregos de anáfora. Essa breve análise não contempla todos os aspectos que podem ainda ser explorados no texto, como o caso de alguns sintagmas nominais e pronominais (educação, saúde, oportunidades na vida, papo legal, grana, eu), dos efeitos de sentido gerados com o uso de interjeições (“aê” tio) e também o tipo de letra escolhida, as cores, o tamanho, o plano de fundo do cenário, a arma que aparece no segundo quadro, o suor no rosto do adulto, as expressões faciais, entre outros aspectos que podem levar o aluno a ampliar sua capacidade crítica e argumentativa, fazendo-o compreender melhor o funcionamento dos mecanismos linguísticos e imagéticos nos textos. Enfim, a tira cômica analisada ancora informações presentes na memória do leitor que permitem a interpretação do conteúdo transmitido.
Essa constatação corrobora com o que afirma Koch (2011, p. 110): “A interpretação de cada anáfora indireta desencadeia, portanto, um processo de estabelecimento de relações semânticas ou conceituais”. A abordagem do tema remete a uma crítica sobre certos políticos que tanto prometem o que nem sempre têm possibilidade de cumprir enquanto a população aguarda o cumprimento das promessas feitas numa situação social desfavorável em relação a eles e convivendo com os problemas sociais ainda a serem resolvidos.
Ao associar os signos verbais com as imagens, percebemos que a crítica se configura e que é possível compreendê-la porque são acionados os conhecimentos comuns a respeito da temática. Todavia, se o leitor não possuir conhecimento do tema explorado na tira cômica, é provável que não consiga atribuir o sentido real da tira. No exemplo, o locutor pressupõe que o leitor tenha conhecimento do assunto tratado, podendo, dessa forma, estabelecer significado. 
 
Especificamente sobre a referenciação, as antecipações feitas pelo produtor do texto visam o estabelecimento de referentes sujeitos à aceitação dos interlocutores que reagem às informações transmitidas na tira por meio da mobilização do seu conhecimento de mundo.
A mescla da linguagem verbal e não verbal mobiliza conhecimentos inferenciais do leitor e aciona uma leitura não linear (que mobiliza vários conhecimentos do leitor, por possuir  diferentes elementos e linguagens). A compreensão da tira cômica se dá, portanto, pela associação de diferentes linguagens que são ativadas (inferências, remissões) e saem de uma leitura linear. Algo que revela a importância da multimodalidade na constituição de sentido da tira cômica, um dos gêneros textuais multimodais estáticos.
Cabe lembrar que as possibilidades de análise não foram esgotadas, pois foram verificadas apenas as retomadas pertinentes para o foco desta pesquisa e sob determinado ponto de vista. Além disso, a compreensão de produções multimodais sob o olhar da Linguística Textual é um assunto que ainda está longe de ser esgotado, pelo contrário,  mostra-se como um campo bastante promissor.
 
 
4 Considerações finais
  
Este estudo que vinculou estratégias de referenciação e produções multimodais  mostrou que é possível aplicar as teorias da Linguística Textual para compreender textos formados com elementos verbais escritos e visuais. Apoiada numa perspectiva sociocognitiva e interacional, a análise considerou a tira cômica em seus múltiplos aspectos, cognitivos e discursivos, na tentativa de compreendê-la globalmente. Assim, essa proposta permite refletir sobre o alargamento do conceito de texto na pretensão de ser útil ao ensino. Por outro lado, enquanto atividades forem pensadas no sentido de melhorar os resultados no ensino, os assuntos sobre o texto ficam longe de serem esgotados.
 
 
 
REFERÊNCIAS
 
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Terceiro e Quarto Ciclos do Ensino Fundamental: Língua Portuguesa. Brasília: MEC/SEF, 1998.
BAKHTIN, Mikhail.. Estética da Criação Verbal. Introdução e Tradução do Russo Paulo Bezerra; Prefácio à Edição Francesa Tzvetan Todorov. 4 ed. Coleção Biblioteca Universal. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
FERRAZ, Janaína de Aquino. Gêneros Multimodais: Novos Caminhos Discursivos. VIII ENIL / Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas: USP, 2008. Disponível em: . Acesso: fev. 2013.
GERALDI, João Wanderley. O Texto na Sala de Aula. 2 ed. Cascavel, Assoeste, 1984.
________. Portos de Passagem. 4 ed. 1997. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
ILARI, Rodolfo. Anáfora e correferência: por que as duas noções não se identificam?. Cadernos de Estudos Linguisticos, Campinas: Unicamp, n. 41, Jul./Dez. 2001.
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KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça. Léxico e Progressão Referencial. Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Mário Vilela. Graça Maria Rio-Torto; Fátima Silva; Olívia Maria Figueiredo (orgs.). Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2006, v. 1. Disponível em: . Acesso: nov.  2011.
________. As Tramas do Texto. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008.
________. Linguagem e Cognição: a Construção e Reconstrução de Objetos-de-Discurso. VeredasRevista de Estudos Linguísticos, Juiz de Fora, v. 6, n. 1, 2009a.
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________; ELIAS, Vanda Maria.  Ler e Compreender: os Sentidos do Texto. 3 ed. 3 reimpressão. São Paulo: Contexto, 2010.
________. Desvendando os Segredos do Texto. 7 ed. São Paulo: Cortez, 2011.
MARCUSCHI, Luiz Antônio. Referenciação e Progressão Tópica: Aspectos Cognitivos e Textuais. Cadernos de Estudos Linguísticos, n. 48, v. 01. Campinas, 2006.
________. Cognição, Linguagem e Práticas Interacionais. Rio de Janeiro: Lucerna, 2007.
________. Produção Textual, Análise de Gêneros e Compreensão. São Paulo: Parábola Editorial, 2008, 5 reimpressão, fev. 2012.
MARTINS, Maria Helena. O que Leitura. 4 ed. São Paulo: Brasiliense, 1984.
PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares da Educação Básica do Paraná. Curitiba: SEED, 2008.
PINHEIRO, Clemilton Lopes. Processos Referenciais em Textos Multimodais: Aplicação ao Ensino. Anais do SIELP - Simpósio Internacional de Ensino de Língua Portuguesa, V. 2, N. 1, Uberlândia: EDUFU, 2012.
POSSENTI, Sírio. Escrever Certo, Escrever Bem. Revista Língua, ano 8, n. 82. São Paulo: Segmento, ago. 2012. Disponível em: Acesso: 09 abr. 2013.
RAMOS, Paulo. Revendo o Formato da Tira Cômica. Intercom - Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, XXXII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, Curitiba, PR, 4 a 7 set. 2009.
________. Estratégias de Referenciação em Textos Multimodais: Uma Aplicação em Tiras Cômicas. Linguagem em (Dis)curso, Tubarão, SC, v. 12, n. 3, set./dez. 2012.
TASSO, Ismara E. V. de Souza. Vinhetas Televisivas: Discurso, Identidade e Representação.  I Colóquio Internacional de Análise do Discurso. São Carlos, SP: EdUFSCar, 2006.

Aspectos principais da literatura

Para facilitar os estudos, segue um quadro das escolas literárias em Portugal e no Brasil.




























Na sequência, segue um resumo da literatura brasileira que ganhei da Editora Ática há alguns anos


























 
 

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

O Gato e a Espiritualidade

 

Quem não se relaciona bem com o próprio inconsciente não topa o gato. Ele aparece, então, como ameaça, porque representa essa relação precária do homem com o (próprio) mistério.
O gato não se relaciona com a aparência do homem. Ele vê além, por dentro e pelo avesso. Relaciona-se com a essência. Se o gesto de carinho é medroso ou substitui inaceitáveis (mas existentes) impulsos secretos de agressão, o gato sabe. E se defende do afago. A relação dele é com o que está oculto, guardado e nem nós queremos, sabemos ou podemos ver. Por isso, quando surge nele um ato de entrega, de subida no colo ou manifestação de afeto, é algo muito verdadeiro, que não pode ser desdenhado. É um gesto de confiança que honra quem o recebe, pois significa um julgamento.
O homem não sabe ver o gato, mas o gato sabe ver o homem. Se há desarmonia real ou latente, o gato sente. Se há solidão, ele sabe e atenua como pode, ele que enfrenta a própria solidão de maneira muito mais valente que nós. Nada diz, não reclama. Afasta-se. Quem não o sabe "ler" pensa que "ele" não está ali. Presente ou ausente, ele ensina e manifesta algo. Perto ou longe, olhando ou fingindo não ver, ele está comunicando códigos que nem sempre (ou quase nunca) sabemos traduzir.
O gato vê mais e vê dentro e além de nós. Relaciona-se com fluídos, auras, fantasmas amigos e opressores. O gato é médium, bruxo, alquimista e parapsicólogo. É uma chance de meditação permanente a nosso lado, a ensinar paciência, atenção, silêncio e mistério. O gato é um monge silencioso, meditativo e sábio monge, a nos devolver as perguntas medrosas esperando que encontremos o caminho na sua busca, em vez de o querer preparado, já conhecido e trilhado.
O gato sempre responde com uma nova questão, remetendo-nos à pesquisa permanente do real, à busca incessante, à certeza de que cada segundo contém a possibilidade de criatividade e de novas inter-relações, infinitas, entre as coisas.
O gato é uma lição diária de afeto verdadeiro e fiel. Suas manifestações são íntimas e profundas. Exigem recolhimento, entrega, atenção. Desatentos não agradam os gatos. Bulhosos os irritam. Tudo o que precise de promoção ou explicação quer afirmação. Vive do verdadeiro e não se ilude com aparências.
Ninguém em toda natureza aprendeu a bastar-se (até na higiene) a si mesmo como o gato! Lição de sono e de musculação, o gato nos ensina todas as posições de respiração ioga. Ensina a dormir com entrega total e diluição recuperante no Cosmos. Ensina a espreguiçar-se com a massagem mais completa em todos os músculos, preparando-os para a ação imediata. Se os preparadores físicos aprendessem o aquecimento do gato, os jogadores reservas não levariam tanto tempo (quase 15 minutos) se aquecendo para entrar em campo. O gato sai do sono para o máximo de ação, tensão e elasticidade num segundo. Conhece o desempenho preciso e milimétrico de cada parte do seu corpo, a qual ama e preserva como a um templo.
Lição de saúde sexual e sensualidade.
Lição de envolvimento amoroso com dedicação integral de vários dias.
Lição de organização familiar e de definição de espaço próprio e território pessoal.
Lição de anatomia, equilíbrio, desempenho muscular. Lição de salto. Lição de silêncio.
Lição de descanso.
Lição de introversão.
Lição de contato com o mistério, com o escuro, com a sombra.
Lição de religiosidade sem ícones.
Lição de alimentação e requinte.
Lição de bom gosto e senso de oportunidade.
Lição de vida, enfim, a mais completa, diária, silenciosa, educada, sem cobranças, sem veemências, sem exigências.
O gato é uma chance de interiorização e sabedoria, posta pelo mistério à disposição do homem. "O gato é um animal que tem muito quartzo na glândula pineal, é portanto um transmutador de energia e um animal útil para cura, pois capta a energia ruim do ambiente e transforma em energia boa, - normalmente onde o gato deita com frequência, significa que não tem boa energia - caso o animal comece a deitar em alguma parte de nosso corpo de forma insistente, é sinal de que aquele órgão ou membro está doente ou prestes a adoecer, pois o bicho já percebeu a energia ruim no referido órgão e então ele escolhe deitar nesta parte do corpo para limpar a energia ruim que tem ali.
Observe que do mesmo jeito que o gato deita em determinado lugar, ele sai de repente, pois ele sente que já limpou a energia do local e não precisa mais dele. O amor do gato pelo dono é de desapego, pois enquanto precisa ele está por perto, quando não, ele se a afasta.
No Egito dos faraós, o gato era adorado na figura da deusa Bastet, representada comumente com corpo de mulher e cabeça de gata. Esta bela deusa era o símbolo da luz, do calor e da energia. Era também o símbolo da lua, e acreditava-se que tinha o poder de fertilizar a terra e os homens, curar doenças e conduzir as almas dos mortos. Nessa época, os gatos eram considerados guardiões do outro mundo, e eram comuns em muitos amuletos. "O gato imortal existe, em algum mundo intermediário entre a vida e a morte, observando e esperando, passivo até o momento em que o espírito humano se torna livre. Então, e somente então, ele irá liderar a alma até seu repouso final."
 
Fonte: The Mythology Of Cats, Gerald & Loretta Hausman
Disponível em: http://www.amazon.co.uk/The-Mythology-Cats-Gerald-Hausman/dp/0312186339